Do Ódio

As pessoas mais sensíveis não devem ver este vídeo. Mesmo que eu não publique vídeos com sangue nem corpos esquartejados, que os há, esta pequena compilação do que está acontecer em Israel e na Faixa de Gaza mostra alguns raptos, assassinatos e violência.
É que ontem mesmo Israel sofreu um ataque pesadíssimo de militares do Hamas que resultou, pelo menos, na morte de mais de duzentos civis israelitas. Os números não são ainda conhecidos, mas sabe-se também que foram raptadas algumas dezenas de civis e militares e que há centenas de feridos. De qualquer forma, independentemente do número final, este é o maior ataque sofrido por Israel em décadas.
É fácil perceber que desta vez a Mossad falhou redondamente nas suas funções e foi incapaz de prever a invasão dos militares do Hamas, que divididos em vários pequenos grupos assaltaram e ocuparam vários postos fronteiriços. A partir daí foi só invadir a zona sul de Israel e executar sumariamente o maio número possível de civis israelitas.
Na verdade, no momento em que escrevo estas linhas, a resposta israelita já teve início mas ainda há combates no sul de Israel e combatentes palestinianos a cruzar a fronteira.
No entanto, não terá sido apenas um erro dos serviços secretos de Israel a permitir este ataque, mas também o apoio claro do Irão e provavelmente da Rússia, o que demonstra claramente que o confronto actual entre o Ocidente e a Rússia ultrapassa muito a questão da Invasão da Ucrânia e está-se a alastrar, pelo menos, a alguns país africanos e ao Médio Oriente.
Para além das mortes, dos feridos e dos raptos, foram também destruídos alguns tanques Merkava, o principal tanque das Forças Armadas de Israel, sendo que pelo menos um desses tanques foi mesmo capturado. O ataque do Hamas foi ainda complementado pelo lançamento de vários foguetes, alguns dos quais conseguiram ultrapassar o famoso escudo protector de mísseis de Israel, o Iron Dome.
O Hamas considera-se um grupo de resistência da Palestina, de inspiração sunita (o que constitui a maioria do Islão) e o seu braço armado nasceu do movimento das Brigadas Izz ad-Din al-Qassam, que esteve por trás da primeiras Intifada em 1987, ou seja, a revolta de palestinos da Cisjordânia contra Israel. É também considerado um Grupo Terrorista pela maior parte dos países Ocidentais.
De qualquer forma, os ataques não foram feitos a partir da Cisjordânia mas sim a partir da Faixa de Gaza e a resposta de Israel já teve início e ninguém acredita que será leve. Para já com o lançamento de vários mísseis para posições do Hamas, mas que deverá envolver também uma invasão terrestre nos próximos dias, já que o governo de Israel já chamou cerca de 80 000 militares na reserva. A invasão terrestre será também uma decisão normal tendo em conta a existência de reféns israelitas nas mãos dos palestinianos
Benjamin Netanyahu avisou os civis palestinianos que devem sair da faixa de Gaza para não sofrerem as consequências do ataque israelita, mas na verdade o direito à mobilidade é algo que não existe por ali, pelo que a somar às vítimas civis israelitas vamos ter agora as da fixa de Gaza.
O Ataque do Hamas foi celebrado nas ruas por palestinianos em todo o mundo. As redes sociais estão repletas também de publicações Pró-Palestina e Pró-Israel, o que é apenas um barómetro do ponto a que esta situação chegou, em que não há mesmo uma solução nem a curto nem a médio prazo.
Israel é uma potência militar brutal e, para quem não sabe, o maior exportador do mundo de tecnologia militar (não de armamento) que nunca parou de se desenvolver desde a histórica vitória na Guerra dos Seis Dias, em 1967, quando derrotou a Liga Árabe, constituída pela Síria, Egito, Jordânia e Iraque apoiados pelo Kuwait, Arábia Saudita, Argélia e Sudão (o Irão sofreu a Revolução Islâmica apenas em 1979). Israel triplicou o seu território nessa guerra.
O processo de Paz Israelo-Palestiniano veio a ter um acordo assinado em Oslo apenas em 1994, pelo ministro de Israel Yitzhak Rabin e pelo presidente a Organização de Libertação da Palestina Yasser Arafat. O acordo previa a retirada das forças armadas israelitas da Faixa de Gaza e da Cisjordânia, a criação de um governo palestiniano e o reconhecimento do Estado de Israel. Nunca nada foi cumprido.
No ano de 2000 deu-se a segunda Intifada e desde então nunca mais houve um processo de Paz.

O Diabo à Nossa Porta

Esta é a pior das notícias. O RS28 Sarmat, cujo desenvolvimento começou em 2009, entrou em fase de produção em série e ainda antes do fim deste ano as primeiras unidades estarão prontas para utilização.

O RS 28 Sarmat, batizado pelos países da Nato como Satan 2, é o míssil balístico intercontinental mais poderoso do planeta, capaz de pôr fim à vida no mesmo tal como a conhecemos.

O seu antecessor, o R36 M, chamado pela Nato de SS18 Satan, foi desenvolvido durante a Guerra Fria, mais concretamente na década de 60, já transportava até 10 ogivas que podiam atingir alvos diferentes até distâncias de 11000 quilómetros, mas o Satan 2 vai muito mais longe. Transporta 15 ogivas e alcança até 18000 quilómetros.

A diferença não fica por aqui. O novo míssil balístico intercontinental russo é capaz de sobrevoar o Polo Sul, o que lhe permite atingir qualquer país Ocidental contornado a maior parte das suas defesas antimísseis, que estão desenhadas essencialmente para o seu antecessor e por isso para ataques vindos do Norte.

Além disso, o Satan 2 tem uma primeira fase de voo muito curta, conseguindo assim diminuir as probabilidades de ser detetado. Essa primeira fase de lançamento de um míssil balístico é quando a sua temperatura tinge valores mais altos, permitindo a sua deteção por infravermelhos. No caso do RS28 Sarmat, para além da janela de tempo para que essa deteção se dê ser muito curta, existe ainda a capacidade para destruir mísseis defensivos de interceção, através da criação de uma nuvem de esferas metálicas.

O Satan 2 é capaz de atingir qualquer ponto do planeta e de facilmente destruir completamente uma zona do tamanho da Península Ibérica, dos Estado do Texas, do reino Unido ou da França. Até 2027 a Rússia conta ter mais de quarenta.

Links adicionais:

https://eurasiantimes.com/putins-satan-is-ready-russia-will-deploys-its-first-sarmat-ballistic-missiles-icbm-by-end-of-2022-vladimir-putin/

https://missilethreat.csis.org/missile/rs-28-sarmat/

Sei o Que Fizeste no Verão Passado

A Lituânia restringiu o tráfego ferroviário no seu território em direcção a Kaliningrado mas, na verdade, o ministro dos Negócios Estrangeiros lituano, Gabrielius Landsbergis, é quem melhor descreve a decisão quando explica que essa restrição se inclui nas sanções europeias aplicadas. É verdade, desde 2014, ano em que a Crimeia foi anexada pela Rússia, que a União Europeia tem vindo aplicar vários pacotes de sanções contra a Rússia.

Podemos perguntar se a Lituânia faria o mesmo se não pertencesse à Nato e à União Europeia e a resposta é óbvia. Não, não faria. E porquê? Primeiro porque sem a Nato e sem a União Europeia provavelmente nem existiria, segundo porque mesmo existindo não se atreveria a provocar a Rússia desta forma. Aliás, nenhum país que tenha pertencido ao Pacto de Varsóvia o faria porque todos têm memória coletiva e sabem o que a Rússia representa historicamente.

Os mais simplistas gostam estrategicamente de explicar a invasão da Ucrânia pela Rússia com a criação de bases da Nato um pouco por toda a Europa Central e do Leste, esquecendo-se do fundamental. É que nenhum país foi obrigado a entrar para a Nato e o motivo pelo qual a maior dos países decidiu fazê-lo chama-se pura e simplesmente "Rússia".

A Rússia não invadiu a Ucrânia por causa das bases da Nato, a Rússia não invadiu a Ucrânia para "desnazificar" a Ucrânia, a Rússia não invadiu a Ucrânia para salvar a população pró-russa do Donbass. A Rússia invadiu a Ucrânia porque Putin tem uma política expansionista de anexação de territórios. Não é apenas a minha opinião, é a opinião do próprio Putin, que no seu discurso dia 9 na televisão estatal russa decidiu prestar tributo ao Czar Pedro o Grande e acrescentar, citando o mesmo, que "chegou o momento de conquistar de volta os territórios que historicamente nos pertencem!".

Não nos enganemos, os territórios que historicamente pertencem à Rússia se tivermos em conta o seu Império antes da Primeira Guerra Mundial incluem a Finlândia, a Estónia, a Letónia, a Lituânia, a Moldávia e a Polónia. Se retornarmos ao princípio do século 18 vamos mais longe, já que o Czar Pedro o Grande chegou a travar uma guerra com a Suécia após Após derrotar o que é hoje a Alemanha e a Dinamarca.

A relação entre toda a Europa Central e do Leste e a Rússia, com excepção da Bielorrússia, é uma espécie de "Sei O que Fizeste No Verão Passado" e há mesmo muita matéria para saber.

Mas voltemos a Kaliningrado, um enclave isolado do resto da Rússia junto ao Mar Báltico, devolvido à Rússia no fim da Segunda Guerra Mundial e que faz fronteira terrestre apenas com a Lituânia e a Polónia. Tem agora algumas restrições nas importações (em carvão, metais, material de construção e tecnologia moderna) que faz via terrestre, mas mais do que isso é a primeira prova de o território russo não está debaixo duma ameaça real pelos Exércitos Ocidentais. São os territórios Ocidentais que poderão ter que se defender duma invasão russa.

A Moldávia (assim como a Geórgia) está parcialmente ocupada pelo exército russo, a Suécia e a Finlândia estão ameaçadas. Agora a Lituânia também. A Ucrânia, todos sabemos, está a ser invadida. Todos eles sabem o que Rússia fez no Verão Passado. Mais a Ocidente também devíamos saber.


Putin Compara-se a Alexandre o Grande

Japão e Estados Unidos, de Inimigos a Aliados

Nos dias 6 e 9 de agosto de 1945, os Estados Unidos utilizaram pela primeira vez na História da humanidade bombas atómicas. A vítima, como é largamente sabido, foi o Japão, no contexto da guerra do Pacífico, inserida na Segunda Guerra Mundial. Naqueles dias as cidades de Hiroshima e Nagasaki foram totalmente destruídas e a grande maioria dos seus habitantes mortos.

A Rendição Total do Japão deu-se a 14 de Agosto seguinte e, na sua sequência, o país foi ocupado pelo Exército dos Estados Unidos da América até 1952, após a assinatura do Acordo de Paz de São Francisco no ano anterior.

Embora o Japão estivesse totalmente devastado pelas duas bombas atómicas, rendeu-se apenas na sequência da Declaração de Potsdam, onde o então presidente norte americano  Harry S. Truman ameaçou os japoneses com a destruição total do país se não se rendesse.

Na Sequência, as Forças Armadas do Japão têm ainda hoje o nome de Forças Armadas de Auto-Defesa Japonesa  já que o Japão ficou proibido de ter Forças Armadas ofensivas.

A realidade no Pacífico mudou bastante desde a década de 50 do século passado e, curiosamente, o Japão é hoje um dos maiores aliados dos Estados Unidos da América. O surgimento da China como grande potência económica e militar, assim como sua iminente invasão a Taiwan, de que já escrevi aqui, é a causa.

É que Xi Jinping ameaça constantemente Taiwan mas também o Japão, onde o ponto mais quente são as desabitadas Ilhas Senkaku, que apesar de japonesas são reclamadas pela China desde que em 2012 se soube que têm gás natural, e a ilha Yonaguni, que apesar de habitada por japoneses é vista pela administração chinesa como uma extensão natural de Taiwan (fica a 125 quilómetros) e, portanto, chinesa.

Estas ilhas, que ficam a Sul do arquipélago de Okinawa fazem já parte de uma linha de Defesa Militar japonesa bem armada e capaz de perceber qualquer ofensiva chinesa através de Radares e Sonares assim como todo o tipo de armamento.

A pergunta que se impõe é se o Japão seria capaz de conter uma ofensiva militar chinesa na região e a resposta é que não. Apesar de ter umas Forças Armadas modernas e de conseguir sem dúvida fazer um grande estrago num ataque chinês, o Japão precisa de aliados na região. É essa corrida para se aproximar dos seus Aliados naturais, ou seja, que tem permitido que o Japão venda armamento àqueles que sofrem com as ameaças e o os abusos da China no mar do Sul da China, ou seja, as Filipinas, a Malásia, o Vietname e até a Austrália.

Todos estes países estão dispostos a apetrechar as suas Forças Aéreas com o Mitsubishi F-2, um caça feito no Japão a partir do projeto do americano F-16. Este avião é apenas um dos muitos exemplos de cooperação militar entre os Estados Unidos da América e o Japão e que permitiu a este último ter um dos Exércitos mais Avançados do mundo no momento.

Dos anos 50 ao presente a História entre os Estados Unidos da América é tão simples como esta, uma passagem rápida de inimigos a aliados estratégicos. falta saber durante quanto tempo poderão conter a ameaça chinesa.

Leitura Adicional:

O F-2 na Airforce Technology

Japan Forward, artigo de opinião 

Venda do F-2 Japonês

Eurasian, a Linha defensiva japonesa 

BTR 90 e o FGM-148 Javelin, uma cena de guerra

 

Este vídeo (tirado do twitter Blue Sauron) mostra um pequeno grupo de voluntários americanos na Guerra da Ucrânia a destruir um BTR 90 russo com um FGM-148 Javelin, um lançador portátil de mísseis anti-tanque produzido nos Estados Unidos. O interesse do vídeo é que em poucos segundos mostra o que tem sido uma das características táticas e tecnológicas mais marcantes desta guerra, com a Rússia a avançar no terreno com um número considerável de blindados e os ucranianos a optar por uma lógica de guerrilha, que é como quem diz do gato e do rato, para destruir o máximo possível de veículos inimigos.

E é do BRT 90 e do FGM-148 Javelin que venho escrever, já que para entender um pouco melhor o teatro de guerra é preciso ter uma noção do armamento envolvido.

A Rússia, que ninguém tenha dúvidas, tem uma série de veículos blindados que são um pesadelo para qualquer força que se lhe oponha e, sem dúvida, o BTR 90 (desenvolvido em 1994) é um dos mais importantes. É uma evolução da série BTR que começou na Guerra Fria com o BTR 40 e passou pelos modelos anteriores BTR 50, BTR 60, BTR 70 e BTR 80.

O principal objetivo de um veículo blindado como o BTR, ao contrário dos tanques clássicos que conhecemos, é transportar tropas com a maior segurança possível Por isso mesmo o BTR 90 foi desenhado para ser anfíbio, podendo facilmente atravessar rios e lagos, e tem uma blindagem NBC, ou seja, capaz de proteger os seus ocupantes de ataques químicos e nucleares, biológicos e químicos. Tem ainda uma armadura reativa explosiva e proteção melhorada contra explosões de minas.

Como armamento de ataque está armado com um poderoso canhão de 30 milímetros, desenvolvido pela primeira vez nos anos 70 mas bastante melhorado na década de 80, Shipunov 2A42, que num minuto pode disparar mais de cinco centenas de munições. A acompanhar este canhão tem ainda uma metralhadora de 7,62 e um  9M113 Konkurs (AT5 Spandrel para a Nato) antitanque.

Para além dos três membros da tripulação pode transportar mais 7 passageiros. É um veículo poderosíssimo que pode ainda receber módulos extra de blindagem, Pesa cerca de 20 toneladas e tem 3.20 metros de largura e três de altura e tem tecnologia de visão térmica e noturna.

Já o Javelin, no vídeo disparado pelos americanos, é um dos mísseis portáteis mais potentes do mundo e utiliza orientação automática por infravermelho, o que permite ao atirador esconder-se imediatamente após o disparo sabendo que não vai falhar o alvo. Começou a ser produzido em 1996 e pode atingir alvos até dois quilómetros de distância. 

A arma é composta pela CLU e pelo tubo de lançamento. Enquanto o tubo é descartável a CLU (Unidade de Comando de Lançamento) é reutilizável. Assim, o militar que a dispara não precisa carregar todo aquele peso, que no total ultrapassa os vinte quilos, para se esconder.

Cada  FGM-148 Javelin completo custa cerca de 170 mil dólares, sendo que a CLU custa 20 mil. Ou seja, destruir este BTR 90 ficou em cerca de 150 mil dólares. O custo do BTR 90 nunca foi divulgado pelo Kremlin.

O que vemos no vídeo são soldados americanos que acredito que tenham estado no Iraque ou no Afeganistão, onde o FGM-148 foi bastante utilizado e por isso devem ter bastante experiência com o mesmo, que sabe que as árvores onde estão escondidos não são suficientes para se esconderem do  BTR 90, que como disse tem capacidade de visibilidade térmica.

O "Go! go! go! go!" de um deles é precisamente porque sabem que têm pouco tempo até serem detectados e, se o forem, provavelmente morrem.

 

Military Today BTR 90

 Weapons System  - Shipunov 2A42,

 Míssil Threat Javelin FGM-148
 

A Vitória de Pirro Russa

A expressão "Vitória de Pirro" é conhecida no mundo militar por significar que o lado vencedor da Guerra está a pagar um custo demasiado alto. Vem do Rei grego Pirro, que em 280 AC depois de vencer várias batalhas contra o poderoso exército romano na Guerra Pírrica, disse aos seus soldados durante os festejos que mais uma vitória igual o arruinaria completamente.

Após três meses exatos da Operação Especial Russa na Ucrânia ou, como eu prefiro chamar-lhe, Guerra da Ucrânia, podemos perguntar quem é que está a vencer a mesma. A resposta é complexa, mas eu diria que Putin estará neste momento com a mesma sensação que Pirro teve no seu combate contra os romanos. Está a Vencer a Guerra, sim, mas a um preço elevadíssimo.

Vamos por partes, até porque a Rússia alterou radicalmente a sua estratégia durante a invasão. Putin cometeu no princípio erros estratégicos graves porque começou por acreditar numa Guerra Relâmpago, uma tática militar inventada pela Alemanha, por isso também chamada de Blitzkrieg, para conseguir vitórias rápidas nas invasões. A Blitzkrieg na Segunda Guerra Mundial era dividida em três fases; a Prioridade, a Penetração e o Objetivo Final. 

A Prioridade passava pela concentração de tanques de Guerra (os famosos Panzer) em solo inimigo para tirar vantagem do efeito surpresa; a Penetração era o avanço das restantes tropas para o terreno com o objetivo de evitar a organização defensiva; o Objetivo Final procurava então o controle total do território e a desmoralização do inimigo. Eventualmente, uma quarta fase era utilizada para eliminar as últimas bolsas de resistência.

Putin não pensou em algo muito diferente na primeira fase, mas o seu primeiro problema foi que, graças à evolução tecnológica na Artilharia, nas armas anti-tanque e nos drones aéreos militares, os tanques perderam definitivamente a sua capacidade demolidora da Segunda Guerra Mundial.

A 24 de Fevereiro a Rússia invadiu a Ucrânia em três frentes de Guerra: a Norte, com o objetivo claro de conquistar as duas maiores cidades ucranianas (Kiev e Kharkiv) e aproveitando a fronteira que o seu aliado Bielorrússia tem com aquele país; a Leste, para controlar as regiões separatistas de Luhansk e Donetsk (que foram a região de Donbass); a Sul, com a ajuda da previamente ocupada região da Crimeia para controlar totalmente o acesso ao Mar Negro e ao Mar de Azov.

Esta Guerra Relâmpago teve um efeito destruidor enorme, mas expôs os tanques russos às primeiras armas descartáveis que os ucranianos receberam de países externos, principalmente a FGM-148 Javelin americana e a Next generation Light Anti-tank Weapon (NLAW) sueca e britânica. Não foi um pormenor o facto da Ucrânia produzir também as suas próprias armas Anti-Tanque, a Stugna-P.

Não se considere, no entanto, que tudo se resumiu a tanques e armas anti-tanquejá que os ucranianos receberam desde o princípio todo o tipo de armamento, incluindo o drone turco Baykar Bayraktar TB2. No entanto, e face ao enorme poder devastador de todo o Exército Russo, a melhor tática ucraniana foi a de tentar transformar uma Guerra em Guerrilha, de forma a causar o maior estrago possível nos russos sem se expor demasiado.

O que se sabe é que a partir do princípio de Abril Putin desviou as sua tropas do Norte para a região do Donbass, onde a Rússia tem avançado, apesar de vagarosamente, para o controle de várias cidades importantes. No momento em que escrevo este texto, os principais combates em Donbass ocorrem nas urbes de Severodonetsk, de Lysychansk (onde apesar de tudo os russos sofreram a maior derrota até ao momento na tentativa de cercar a cidade) e de Popasna.

A partir do Sul, as forças russas concentraram-se essencialmente no controle de Mariupol, cuja conquista lhes permitiu já o controle total do Mar de Azov. Para tal cercaram a cidade a partir de duas frentes, uma saída da Crimeia (controlada pela Rússia desde 2014) e outra de Donetsk (esta composta apenas por separatistas ucranianos e militares tchetchenos). O cerco da cidade, que durou cerca de um mês, e o controle do mar de Azov, impediu a resistência ucraniana de ser reforçada. Assim, a mesma foi-se encolhendo até se limitar à grande fábrica daquela cidade como último reduto.

Não se pense, no entanto, na Fábrica Azovstal como uma pequena unidade de produção. Era, na verdade, uma autêntica cidade que teve que ser bombardeada dias a fio antes de ser conquistada, e de onde Putin chegou a ordenar que os seus soldados saíssem por estarem a ser massacrados nas lutas urbanas. Os ucranianos renderam-se a 17 de Maio.

É impossível saber o número de mortes militares de cada um dos lados deste conflito, até porque os dados conhecidos são sempre manipulados pelos próprios, mas Volodymyr Zelenskyy já admitiu a morte de pelo menos 50 ucranianos por dia. Do lado russo, a maior parte das fontes falar em cerca de quinze mil mortes. Sendo impossível confirmar estes números, o que podemos ter a certeza é que esta lenta vitória russa é também uma vitória de Pirro.

Entenda-se, claro, este texto como uma mera opinião e análise militar. O custo e o sofrimento dos Civis é o maior de todos e, por aí, não há Pirro que aguente.

Links adicionais:

The Guardian (Armas fornecidas à Ucrânia)

NLAW oficial 

Forces (vídeo sobre Azovstal) 

BBC (armas para a Ucrânia) 

Understanding War (a segunda fase russa) 

A Guerra Relâmpago (tese) 

Ohchr (vítimas civis)

Qual é o papel da Turquia na Nato?

Sabemos que a invasão russa da Ucrânia em Larga escala alterou, principalmente nos países vizinhos do Báltico, o Paradigma de Segurança Europeu. Existe uma Europa antes da invasão e outra Europa depois. O que é mudou? A importância da Nato aos olhos da maior parte dos países europeus. Por ironia do destino, Putin acaba por ser o maior contributo para o crescimento do seu maior inimigo: a Nato.

Depois da "Operação Especial Russa" tanto a Finlândia como a Suécia, países orgulhosamente neutros até então, já fizeram os seus pedidos de adesão à Aliança do Atlântico Norte. O interessante é que o maior entrave à entrada desses países na Organização tem sido um país que lhe é pertencente. A Turquia, claro.

Há várias razões para levar Erdogan, atual presidente turco, a ameaçar vetar a entrada da Suécia e da Finlândia na Nato, aproveitando a questão estatutária que obriga a que todos os países membros estejam a favor da entrada de novos membros. Todas essas razões são, do ponto de vista turco, essenciais. 

Comecemos pela mais simples: os curdos. E quem são os curdos? Bem, para o que interessa nesta questão são um grupo étnico de mais de trinta milhões de pessoas sem Nação que vivem essencialmente junto à Arménia, Irão, Síria, Iraque e Turquia, com vários grupos armados e que lutam pela existência do Curdistão na zona desde o fim da Primeira Guerra Mundial, ou seja, desde o fim do Império Otomano.

O Curdistão chegou a estar previsto no Tratado de Sèvres, assinado entre os vitoriosos Aliados e os derrotados Otomanos em 1920, mas a Guerra da Independência Turca mudou a lógica desse tratado, muito por causa do apoio russo ao Exército do herói turco Mustafa Kemal Atatürk, que acabou por ser o fundador e primeiro presidente da Turquia após a assinatura do Tratado de Lausanne em 1923, que anulou o Tratado anterior e pôs fim às pretensões curdas.

Desde então que curdos e turcos são simplesmente inimigos e, coincidência das coincidências, a Finlândia e a Suécia são os países que maior apoio declarado dão aos primeiros, sendo mesmo os países que mais abrigam membros do PKK, o Partido dos Trabalhadores do Curdistão e que é, aos olhos da Turquia, uma organização terrorista.

O PKK, recorde-se, era também uma organização terrorista aos olhos da Casa Branca até se tornar um partido aliado dos americanos na Guerra da Síria, onde ambos enfrentaram os combatentes do Estado Islâmico. Ao mesmo tempo, nessa Guerra, os curdos lutaram contra os turcos que, por sua vez, também lutaram contra o Estado Islâmico. Parece confuso e é, mas ainda se torna mais quando sabemos o Exército Sírio, apoiado pelo russo, fez uma trégua com os Curdos e ambos chegaram a lutar lado a lado contra os turcos quando estes invadiram o norte da Síria.

Lavem agora as ideias, porque a resistência da Turquia à entrada de novos membros na Nato vai mais longe. É que a Nato afastou há três anos a Turquia do projeto do desenvolvimento do F-35, o caça de quinta geração mais avançado do planeta neste momento e que envolveu países como os Estados Unidos, o Reino Unido, os Países Baixos, a Austrália, o Canadá, a Itália, a Dinamarca, a Noruega e a própria Turquia, posta de parte quando infringiu as regras da Nato e comprou várias S400, defesas anti-aéreas Made In Rússia. 

Por fim, mas não menos importante, Fethullah Gülen, um líder religioso turco acusado por Erdogan de ter sido o mentor da tentativa de Golpe de Estado na Turquia em 2016 (acusações que o próprio nega), que vive refugiado nos Estados Unidos da América e cuja extradição tem sido recusada pela Casa Branca.

O "Sim" da Turquia à entrada dos novos Membros na Nato estará assim dependente de muitas cedências por parte dos Estados Unidos, da Suécia, da Finlândia e da própria Nato. É possível que os Curdos sejam abandonados pelos países Europeus, que a Turquia volte ao projeto do F-35 e que Fethullah Gülen seja mesmo extraditado. Não sei se vai acontecer tudo isso, mas sei pelo menos que aos olhos da Nato a Turquia vale tudo isso. Está numa posição geográfica importantíssima, tem muito dinheiro e tem uma muito importante indústria de armamento de que hei-de falar aqui um dia.

O que podemos todos ter a certeza, é que num Mundo cada vez mais de extremos, com a Rússia decidida a ser a grande aliada militar da China e com os países da Nato numa aliança militar com alguns países asiáticos e sul americanos como o Japão e a Colômbia, a Turquia não será um pormenor.

É complexo e difícil, mas ninguém disse que seria fácil.

Basta olhar para a Guerra na Ucrânia e perceber que a Turquia cedeu aos ucranianos o Baykar Bayraktar TB2, um dos drones de Guerra mais temidos no mundo, e que ao mesmo tempo se recusa impedir que navios de guerra russos acessem o Mar Negro através dos seus Estreitos.


Se me perguntarem se acho que nos próximos dez anos vai estalar a Guerra entra a China e Taiwan, a resposta é Sim.

Joe Biden, presidente norte americano, foi claro hoje nas suas declarações, durante a sua visita oficial ao Japão, sobre as pretensões chinesas em Taiwan. Em caso de agressão chinesa à ilha, os Estados Unidos da América utilizarão a força para a defender. É uma resposta direta e ameaçadora a Xi Jinping, que já assumiu que pretende invadir Taiwan e, convenhamos, não vai recuar nas suas intenções.

Para o próprio Xi Jinping, que já assumiu que até 2050 a China será a potência hegemónica global, Taiwan é uma pedra no sapato que vai ter que ser descartada. E que pedra!

Se é verdade que como potência mundial a China já assegurou a sua supremacia Económica, tanto através da produção interna a baixo custo como do controle da matéria-prima de outros países, principalmente na América do Sul e no continente africano, Taiwan representa antes de tudo uma brecha na sua Segurança Militar.

Na verdade, ameaças como esta entre os Estados Unidas da América e a China não são novidade. O próprio Xi Jinping já garantiu que a unificação é inevitável, mesmo sabendo que essa unificação significa o início duma Guerra prolongada e destrutiva.

O Contexto Histórico desta ferida Aberta é conhecido. Em 1949 as forças comunistas de Mao Tse Tung, após vencerem a Guerra Civil na China, fundaram a República Popular da China. O seu opositor, Jiang Kai Shek, nacionalista e pró-americano, refugiou-se na ilha e fundou a República da China. Desde então que a República Popular da China faz uma pressão enorme sobre a pequena ilha e a verdade é que Taiwan não é reconhecido como país pelas Nações Unidas.

Taiwan, no entanto, insiste na sua independência como país. Tem bandeira, hino e governo próprios. A sua atual presidente é uma mulher, Tsai Ing-wen, que tem seguido a política anterior de estabelecer parceiras económicas com diversos países no mundo inteiro. Foi ela quem recusou a proposta de Reunificação com estatuto especial de Autonomia (à semelhança de Hong Kong) feita por Xi Jinping.

O que está em causa, portanto, é um povo que tem um estilo de vida completamente diferente do da República Popular da China, onde conceitos tão simples como Democracia e Direitos Humanos, aos olhos dos seus vizinhos, seriam anulados caso Taiwan perdesse a independência.

Recusada a Reunificação resta apenas uma via, a da invasão e portanto da Guerra. Sejamos práticos e objetivos nesta matéria: A China controlaria Taiwan em apenas duas ou três semanas sem nenhuma dúvida, dada a sua supremacia militar face a Taiwan, mas sofreria muitas baixas e causaria ainda mais baixas civis, o que provocaria uma resposta internacional principalmente na resistência à importação de toda a Mais Valia que a China produz. Isto, claro, sem contarmos com as mais do que evidentes ajudas externas dos Estados Unidos e do Japão a Taiwan.

O processo já começou há muito tempo, na verdade, e o Mar do Sul da China, o mais movimentado do nosso planeta (um terço dos navios cargueiros passa por ali), é hoje um autêntico barril de pólvora dada a construção de ilhas artificiais militares chinesas. Essa mar banha também a costa marítima das Filipinas, do Vietname, da Malásia e do Brunei, mas a zona económica exclusiva de cada um desses países já foi anulada por essas construções e, pior ainda, pelas declarações do próprio presidente Chinês que reivindica todo o Mar para si mesmo. É um abuso? É. teve uma resposta à altura da comunidade internacional? Não.

A partir dessas ilhas é possível à China enviar caças e bombardeiros a cada um dos países vizinhos, já que todas elas têm pista de aviões e presença da Força Aérea Chinesa e atualmente apenas navios e aviões americanos ousam navegar ou sobrevoar a zona causando regularmente tensões entre os dois.

Voltando a Taiwan, torna-se evidente que do ponto de vista chinês não pode permanecer independente. É por isso que se tem reforçado como pode militarmente. Já opera os caças F16 mais avançados do planeta, tem centenas de mísseis e minas anti-navio (a China só poderá fazer uma invasão por mar ou pelo céu), mísseis terra-ar, drones militares e gastou recentemente muitos milhões em armamento, tudo para tentar fazer recuar as ameaças chinesas, que se têm concretizado através de exercícios militares com violações constantes do espaço aéreo e marítimo de Taiwan.

Se me perguntarem se acho que nos próximos dez anos vai estalar a Guerra entra a China e Taiwan, a resposta é Sim.

Links de suporte: 

Reuters (declarações de Joe Biden)

Straitstimes (Xi Jinping fala da Reunificação)

DW (Taiwan recusa proposta chinesa) 

BBC (ilhas no Mar do Sul da China) 

Tha Guardian (China invade espaço aéreo de Taiwan)



Do Ódio

As pessoas mais sensíveis não devem ver este vídeo. Mesmo que eu não publique vídeos com sangue nem corpos esquartejados, que os há, esta pe...