Qual é o papel da Turquia na Nato?

Sabemos que a invasão russa da Ucrânia em Larga escala alterou, principalmente nos países vizinhos do Báltico, o Paradigma de Segurança Europeu. Existe uma Europa antes da invasão e outra Europa depois. O que é mudou? A importância da Nato aos olhos da maior parte dos países europeus. Por ironia do destino, Putin acaba por ser o maior contributo para o crescimento do seu maior inimigo: a Nato.

Depois da "Operação Especial Russa" tanto a Finlândia como a Suécia, países orgulhosamente neutros até então, já fizeram os seus pedidos de adesão à Aliança do Atlântico Norte. O interessante é que o maior entrave à entrada desses países na Organização tem sido um país que lhe é pertencente. A Turquia, claro.

Há várias razões para levar Erdogan, atual presidente turco, a ameaçar vetar a entrada da Suécia e da Finlândia na Nato, aproveitando a questão estatutária que obriga a que todos os países membros estejam a favor da entrada de novos membros. Todas essas razões são, do ponto de vista turco, essenciais. 

Comecemos pela mais simples: os curdos. E quem são os curdos? Bem, para o que interessa nesta questão são um grupo étnico de mais de trinta milhões de pessoas sem Nação que vivem essencialmente junto à Arménia, Irão, Síria, Iraque e Turquia, com vários grupos armados e que lutam pela existência do Curdistão na zona desde o fim da Primeira Guerra Mundial, ou seja, desde o fim do Império Otomano.

O Curdistão chegou a estar previsto no Tratado de Sèvres, assinado entre os vitoriosos Aliados e os derrotados Otomanos em 1920, mas a Guerra da Independência Turca mudou a lógica desse tratado, muito por causa do apoio russo ao Exército do herói turco Mustafa Kemal Atatürk, que acabou por ser o fundador e primeiro presidente da Turquia após a assinatura do Tratado de Lausanne em 1923, que anulou o Tratado anterior e pôs fim às pretensões curdas.

Desde então que curdos e turcos são simplesmente inimigos e, coincidência das coincidências, a Finlândia e a Suécia são os países que maior apoio declarado dão aos primeiros, sendo mesmo os países que mais abrigam membros do PKK, o Partido dos Trabalhadores do Curdistão e que é, aos olhos da Turquia, uma organização terrorista.

O PKK, recorde-se, era também uma organização terrorista aos olhos da Casa Branca até se tornar um partido aliado dos americanos na Guerra da Síria, onde ambos enfrentaram os combatentes do Estado Islâmico. Ao mesmo tempo, nessa Guerra, os curdos lutaram contra os turcos que, por sua vez, também lutaram contra o Estado Islâmico. Parece confuso e é, mas ainda se torna mais quando sabemos o Exército Sírio, apoiado pelo russo, fez uma trégua com os Curdos e ambos chegaram a lutar lado a lado contra os turcos quando estes invadiram o norte da Síria.

Lavem agora as ideias, porque a resistência da Turquia à entrada de novos membros na Nato vai mais longe. É que a Nato afastou há três anos a Turquia do projeto do desenvolvimento do F-35, o caça de quinta geração mais avançado do planeta neste momento e que envolveu países como os Estados Unidos, o Reino Unido, os Países Baixos, a Austrália, o Canadá, a Itália, a Dinamarca, a Noruega e a própria Turquia, posta de parte quando infringiu as regras da Nato e comprou várias S400, defesas anti-aéreas Made In Rússia. 

Por fim, mas não menos importante, Fethullah Gülen, um líder religioso turco acusado por Erdogan de ter sido o mentor da tentativa de Golpe de Estado na Turquia em 2016 (acusações que o próprio nega), que vive refugiado nos Estados Unidos da América e cuja extradição tem sido recusada pela Casa Branca.

O "Sim" da Turquia à entrada dos novos Membros na Nato estará assim dependente de muitas cedências por parte dos Estados Unidos, da Suécia, da Finlândia e da própria Nato. É possível que os Curdos sejam abandonados pelos países Europeus, que a Turquia volte ao projeto do F-35 e que Fethullah Gülen seja mesmo extraditado. Não sei se vai acontecer tudo isso, mas sei pelo menos que aos olhos da Nato a Turquia vale tudo isso. Está numa posição geográfica importantíssima, tem muito dinheiro e tem uma muito importante indústria de armamento de que hei-de falar aqui um dia.

O que podemos todos ter a certeza, é que num Mundo cada vez mais de extremos, com a Rússia decidida a ser a grande aliada militar da China e com os países da Nato numa aliança militar com alguns países asiáticos e sul americanos como o Japão e a Colômbia, a Turquia não será um pormenor.

É complexo e difícil, mas ninguém disse que seria fácil.

Basta olhar para a Guerra na Ucrânia e perceber que a Turquia cedeu aos ucranianos o Baykar Bayraktar TB2, um dos drones de Guerra mais temidos no mundo, e que ao mesmo tempo se recusa impedir que navios de guerra russos acessem o Mar Negro através dos seus Estreitos.


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